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Blog editor

August 7th, 2014

O urbanismo entre a favela e o chique

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O urbanismo entre a favela e o chique

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ijYZ0E2M_biggerAs representações de territórios de favelas têm múltiplas camadas de significação. Neste post, Ann Deslandes discute as promessas e perigos de projetos ‘favela chic’, representações particulares e releituras de favelas na Anglofonia. (English version here)

*Tradução por Tábata Ribeiro Reis.

A favela, como Bianca Freire-Medeiros nos mostra, é um referencial itinerante. A favela parece para Adriana Kertzer como uma cifra de brasilidade e para Janice Perlman como uma informalidade urbana. Por outro lado, ela se aproxima de uma espécie de bairro renovado com os prazeres de uma noite de festa.

Sendo um referencial, na “Anglofonia” da língua inglesa a favela brasileira é facilmente reconhecida como um submundo do crime de grande altitude. Mais recentemente, o referencial começou a desvanecer-se em nosso esforço em reimaginar cidades acessíveis, sustentáveis e socialmente justas.

Em 2009 o futurista e colunista da revista Wired, Bruce Sterling, baseou-se em ambas as ideias da favela – a sua ilegalidade, bem como a sua sustentabilidade – para definir sua versão do termo “favela chic” (favela chique). Uma extensão do futuro de “alta tecnologia e baixo nível de vida” do cyberpunk, a favela chic marca a infraestrutura de um mundo “pós-escassez”. Sterling mobiliza a favela, neste caso, para sinalizar um urbanismo em rede de caráter temporário, com baixo custo e provisoriedade “sempre-em-beta”. Sua consideração inclui aplausos por um projeto bem-sucedido de renovação urbana, na costa leste da Austrália. “Renovar Newcastle”, que se tornou um protótipo para projetos semelhantes em centenas de cidades, utiliza edifícios comerciais desocupados e os “ativa” para um uso criativo de forma temporária e de baixo custo. Sterling destaca, no “Renovar Newcastle”, a reutilização de prédios abandonados, sua utilização das mídias sociais e o fornecimento de internet sem fio gratuita, e suas iniciativas de atividades sem fins lucrativos. Menciona que o projeto é possibilitado mediante um planejamento urbano de duração indefinida e um título paralegal de posse de terra, que também se alinham ao futuro da favela chique.

Crédito: Scott Roberts CC BY-NC-ND 2.0
Crédito: Scott Roberts CC BY-NC-ND 2.0

Desta forma, Sterling estabelece uma ligação entre o urbanismo da favela e as práticas urbanistas de “faça-você-mesmo” da Anglofonia. De fato, o discurso urbanista de DIY (Do-It-Yourself, termo em inglês para faça-você-mesmo) é caracterizado pelo comprometimento com a informalidade e a inovação da favela. Como eu havia especulado, a favela chic e o urbanismo DIY também podem estar ligados no que eles ainda estão por explicar. Como tantas invocações sobre a favela, Sterling se estabelece fora da especificidade histórica das favelas do Brasil. A questão sobre se os favelados poderiam reconhecer a si mesmos ou ao seu ambiente construído sobre as ruas de uma cidade pós-industrial australiana ainda está faltando. De forma semelhante, o discurso urbanista de DIY corre o risco de calar os tipos “miseráveis” de informalidade urbana, amadorismo e marginalidade. Urbanistas DIY citam o trabalho duro, o voluntarismo e a recusa de especialistas para a celebração do uso produtivo do espaço abandonado: repovoando-o com uma atividade econômica. Isso, como eu observo no meu artigo, é perseguido como um rebate aos fenômenos abjetos de usurpação, pichação e vandalismo, que, caso contrário, poderiam ocultar-se ali.

Sterling convoca um mundo de “pós-escassez”, mas me pergunto se caso estivéssemos quase lá, se precisaríamos desprezar o uso particular dos usuários do espaço, a fim de reivindicar a produtividade para o uso de nossa preferência. A promessa de devolver capital às partes “abandonadas” da cidade é, sem dúvida, informada devido à ansiedade pela escassez sentida: à medida que sabemos que o abrigo e a sociabilidade estão trancados em regulamentos de propriedade, em preços inflacionados e em experiência profissional. Eu também gostaria de saber se a escassez também diminui a nossa ambição, obrigando-nos a concordar com a degradação da “favela”, a fim de alegar um capitalizável ​​“chique”.

Onde Sterling corre o risco de suprimir a especificidade histórica da favela, o discurso urbanista de faça-você-mesmo põe em risco a eliminação de pessoas muito facilmente rotuladas posseiros, grafiteiros e vândalos – pessoas criminalizadas que podem também merecer viver em nossas cidades. Talvez esta também seja uma forma de como podemos vir a ter uma discussão sobre o significado da favela sem participação nenhuma das pessoas que vivem lá.

A Dra. Ann Deslandes é uma pesquisadora e  escritora freelance baseada em Sydney. Atualmente ela investiga a significação mundial da favela nos discursos do urbanismo de “faça-você-mesmo” e placemaking. Mais informações disponíveis em XTerraFirma.


Os pontos de vista e as opiniões expressas neste post são de exclusiva responsabilidade do autor e não representam as do Blog Favelas@LSE nem da LSE. 

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Posted In: Brazil | In Translation | Urbanism

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